Wednesday, August 25, 2010

Ser mulher é seguir em frente

Texto e fotos da exposição "Ser mulher é seguir em frente", produzida especialmente para o Grande ato das Mulheres por Sergipe, que aconteceu ontem, dia 24, no Iate Clube. As fotos são de Melissa Warwick e o texto é meu.



Como uma rosa, a mulher é um ser belo porque carrega consigo cor e suavidade, mas também porque não esconde os seus espinhos. Em toda mulher há o sentido que intui o verdadeiro caminho, mas há mais forte aquele que luta contra as suas próprias vontades pelo prazer de proporcionar a felicidade ao outro.



Ser mulher é sempre oferecer colo ao passado sem deixar de acariciar o presente e de acreditar no futuro. Toda mulher tem direito à livre imaginação para colorir mundos com a confiança e a humildade de quem tudo sabe, tudo imagina e tudo espera.



Ser mulher é nascer delicada. É não ter medo de experimentar as sensações que a vida lhe proporciona, mesmo que ao final venha a dor. Toda mulher tem direito a ser curiosa e a encarar a vida como um palco de experiências únicas.



Em toda mulher, persiste a criança que não se furta em sorrir para o outro porque sabe que a melhor forma de caminhar é com as mãos dadas. Toda mulher tem direito a sempre continuar jovem e a fazer da vida uma constante descoberta.



Ser mulher é ser solidária. O coração feminino possui mãos que se estendem para dar carinho e esperança. Toda mulher tem direito a dizer não ao egoísmo, ao abandono, ao preconceito, à injustiça, e a encarar o desafio de viver em harmonia com a sua sociedade.



Ser mulher é sempre ter forças para reinventar o seu próprio caminho. Toda mulher tem direito a ser livre para viver as manhãs de sol, as tardes chuvosas, as alegrias e as dores que te fazem crescer e ser feminina.



Ser mulher é abrigar em seu destino a missão de preparar outro ser para o mundo. O amor de mãe vem antes da primeira vista. Ama-se o que ainda não conhece. Ama-se o que mais tarde, fatalmente, vai deixar partir. Toda mulher tem direito a viver o amor incondicional por seu filho.



Ser mulher é estar ao lado e compreender quando não é necessário falar, mas apenas sentir. É encarar o peso dos anos com a mesma paciência de quem um dia ensinou o seu filho a andar. Toda mulher tem direito a ser respeitada por sua experiência e a envelhecer com dignidade.



Ser mulher é carregar em si os saberes de uma tradição com a humildade de quem está destinada a perpetuá-los. Toda mulher tem direito a conduzir e a preservar a sua história e a de seu povo.



Ser mulher é saber expressar seus sentimentos. É sentir desconfiança, amor, graça, tristeza, carinho sem medo de não ser compreendida. Toda mulher tem direito a viver seus sentimentos sem precisar negociá-los.



Ser mulher é pôr delicadeza em seu ofício, ainda que a outros olhos não pareça tão importante assim. Toda mulher tem direito a viver do fruto do seu trabalho e a se sentir valorizada por seus saberes e por seu talento.



Ser mulher é ser múltipla. É construir castelos, vestir fantasias, cultivar sonhos e acreditar neles. Toda mulher tem direito a exibir suas várias nuances, e a sonhar com a garra de lutar para que eles se tornem realidade.



Ser mulher é ser cúmplice do seu corpo. É perceber as suas limitações, mas não se intimidar diante dos desafios de envelhecer. Toda mulher tem direito a ser saudável, a se amar como é e a viver uma vida plena.



Ser mulher é oferecer seus ouvidos para compreender o outro. Ser companheira e conselheira, e também ser confidente. Ser mulher é saber o melhor momento para falar ou calar. Toda mulher tem direito a ter os seus momentos de silêncio, de segredo ou de cumplicidade.



Fé é uma palavra feminina presente em toda mulher. Fé no amanhã, fé na Humanidade, fé na sua própria força. Toda mulher tem direito a escolher a sua religião e a ser respeitada por sua crença.



Ser mulher é vivenciar os preconceitos sem deixar que eles limitem a sua existência no mundo. Toda mulher tem direito a viver plenamente todas as formas de amor e a ser respeitada por suas escolhas.



Ser mulher é ser forte sem perder a graciosidade. É ser guerreira de uma luta sem armas e sem sangue. Toda mulher tem direito a ser forte sem medo de perder o seu encanto.



Ser mulher é levar com graça a dança da vida. É sempre escolher a melhor música para guiar os seus caminhos. Toda mulher tem direito a ser alegre, a dançar, a brincar com a sua liberdade.


Foto: Kadydja Albuquerque

A verdadeira mulher olha confiante para o futuro. Sabe que existem momentos de medo, mas que são fases que conduzem a um novo tempo. Toda mulher tem direito a acreditar no amanhã e a defender o mundo melhor.



Ser mulher é compreender seu próprio caminho. Encarar seus desvios, atalhos, obstáculos. Valorizar as pontes que unem suas histórias e a paisagem que se desenha ao longo da vida. Toda mulher tem direito a caminhar à sua maneira. Toda mulher sabe que a melhor escolha, sempre, é seguir em frente.

Monday, August 16, 2010

O lugar do poeta

Em todo poeta há um lugar.
Um mundo sem estradas,
um canto sem sentido
onde vivem os versos.

Um mundo diverso,
uma cidade fantasma,
onde só moram palavras,
todas órfãs da razão.

Cada poeta é um universo
que se divide em outros.
É tanto a procurar pouco.
Um grito já nascendo rouco.

A nação do poeta é um país
longe, abstrato, sitiado.
Na solidão do seu parto,
o poeta nasce pra dentro.

Kadydja Albuquerque, agosto de 2010

Friday, August 13, 2010

Reinvenção


A menina e o pombo. Rio Branco, julho de 2010.

A vida só é possível
reinventada.


Anda o sol pelas campinas
e passeia a mão dourada
pelas águas, pelas folhas...
Ah! tudo bolhas
que vem de fundas piscinas
de ilusionismo... — mais nada.


Mas a vida, a vida, a vida,
a vida só é possível
reinventada.


Vem a lua, vem, retira
as algemas dos meus braços.
Projeto-me por espaços
cheios da tua Figura.
Tudo mentira! Mentira
da lua, na noite escura.


Não te encontro, não te alcanço...
Só — no tempo equilibrada,
desprendo-me do balanço
que além do tempo me leva.
Só — na treva,
fico: recebida e dada.


Porque a vida, a vida, a vida,
a vida só é possível
reinventada.

Cecília Meireles

Sunday, July 18, 2010

Hipertexto balzaquiano (ou uma construção confusa sobre autoconhecimento)

Estou há dez dias de ingressar de cabeça, tronco e membros em meus 30 anos. E isso tem me feito dialogar comigo mesma como uma espécie de ritualidade obrigatória a uma mulher que carregará o rótulo de balzaquiana. Um rito que fará toda diferença quando chegar o momento. Assumirei eu o rótulo com o mesmo terror das mulheres que carregavam a letra Escarlate, ou farei desses novos anos a mais rica experiência da minha vida? Nem Freud, tampouco Balzac, podem me apontar um caminho. Até porque eu já o sei.

Tenho pensado muito sobre o silêncio como um caminho para a transformação. Não o silêncio que exclui, mas aquele que acolhe. O silêncio da voz que evita palavras ingratas. O descanso do ouvido que não permite menos do que oferece. A lealdade do coração que ama mais a si mesmo.

Calar como uma forma de autoconhecimento. Vedar olhos e ouvidos para referências externas que só provocam ruídos em sua essência. Ouvir aquilo que valha. Dizer apenas o que encontra ressonância. Sentir o que não há pretensão de ser falso. Ser imperativo em sua vontade de não mais ser pautada pelo que pensam de você, pelo que querem de você, mas pelo que você pensa e quer de si mesma.

Toda mudança é imperativa porque só surge diante dos reveses. E toda mudança passa pela pausa. E toda pausa só é legítima quando anda de mãos dadas com o silêncio. Toda pessoa muda. Toda muda, cala.

Ao calar, o ato de mudar continua imperativo, mas o caminho é, sobretudo, reflexivo. Se as pessoas bem soubessem, calariam diante do medo de expressar. O equívoco é amigo do medo. E este é ardiloso diante da ação. Despe de pureza qualquer ato que se pretenda sublime em sua essência, em seu querer. E o torna vulgar, mesmo que os olhos digam outra coisa, que o coração grite imperativo, acenando com seu cardápio de sonhos: Mude. Faça diferente. Seja você.

E o que é ser você? Não há listas de virtudes e defeitos que definam um ser humano. Somos obra de uma bagagem que nunca será despachada. Somos uma construção troncha e bela de um passado que nos marca, de um presente que ainda incomoda, e de um futuro com o qual flertamos impotentes. Julgamos saber quem somos porque evitamos aceitar que a vida dobra esquinas e nos surpreende sempre com os acasos à espreita. Somos também soma dos acasos que nos sabotam e nos fazem correr pro espelho para questionar mais uma vez: quem é você mesmo?

Não há chegada no caminho do autoconhecimento. Há uma estrada que transforma esse eterno conhecer mais belo. Uma estrada de silêncio e grito. De coisas que precisam ser ditas e de outras tantas que devem ser transformadas em pausas sonoras. Ouvi uma frase que me remeteu a este caminhar solitário: “Em uma canção, as pausas são tão importantes quanto os sons. Ainda na pausa, a canção continua”.

E só há uma chance da canção da vida continuar sem lhe ser ingrata: quando você caminha consigo mesma. E isso não significa isolamento. Não nos valemos ao construir bolhas. Caminhar consigo mesmo é viver fiel ao que diariamente te define, te molda, te certifica. É saber que de círculos não nascem quadrados, e que por isso nem toda oferta deve estremecer a sua procura.

Esse é um texto que fala sobre silêncio, caminhos, pausas, ofertas e autoconhecimento. É confuso como o pensamento humano. É hipertextual como os caminhos que nos ligam a nós mesmos. É virtual porque é passível de concretização. É líquido como os sentimentos que nos fogem pelas mãos da inviabilidade, e nos fazem sempre avançar ou recuar. Suas, minhas mãos, de qualquer um que se confronte. É uma forma de fazer entender que nada nessa vida é legítimo se não constar como cláusula em seu contrato pessoal. E que qualquer atitude sua se justifica apenas se for leal com o seu caminho, com o seu querer. Só assim.

Do contrário, é silêncio amordaçado, é descaminho disfarçado de pausa, é uma canção desafinada, é apenas mais uma forma covarde de desprezar a força de suas escolhas. E, por Deus, nunca coloque nas mãos dos outros a capacidade de escolher pelo seu caminho. É como entregar a sua vida a quem não sabe o que fazer com a sua própria. É se permitir secundário. É o único abandono insuportável.

É o que eu me permiti aprender nesses 30 anos.

Thursday, June 3, 2010

Para minha mãe




Uma declaração de amor se faz de diversas formas. Da forma mais direta, olho no olho, a voz expressa o que o coração pulsa. Existem declarações através dos gestos mais sutis, como segurar a mão de quem confronta o medo. Declara-se amor também na repulsa, no silêncio, na distância. Como eu declaro agora, porque não há como entregar o olhar, ou a mão, ou o medo.

Entrego a saudade, que de tão companheira, virou parente e utiliza o nosso sobrenome. Há 30 anos, eu venci o meu primeiro desafio e vim ao mundo pelo ventre dessa mulher. Ou seria dessa menina, que aos 20, escolheu o mais árduo dos ofícios: ser mãe e esposa. E que, como todas nós, constrói a sua vida com as escolhas que faz. Minha mãe. Uma mulher tão mulher, que me provoca frustração ao me confrontar no espelho.



Minha mãe, com quem ouvi pela primeira vez Gilberto Gil, ainda no ventre. E que anos depois, ainda lembrava das canções. O verdadeiro amor é vão, e estende-se infinito... Só o amor de uma mãe é vão, é infinito, é eterno. Às vezes, nos percebemos buscando outro tipo de amor, porque o ser humano é, por natureza, caçador do que lhe falta, e esquecedor do que já possui. Mas quando essa busca cai no vazio, é o amor incondicional, aquele que enfrenta qualquer distância, e que te aceita de qualquer forma, que mantém o sentido de estar aqui nesta vida.

E devo isso a minha mãe. Uma mulher para quem pouco expressei meus sentimentos, mas que nunca deixou de enxergar o meu coração. O coração de uma mãe pulsa na mesma sintonia que o da sua cria. Não precisa falar, não carece escrever.



A maior prova de amor que a minha mãe já me deu foi me aceitar como eu sou. “Tudo que eu quero é que você seja feliz”. Sou bicho criado fora das convenções. Sou projeto de filha que não respeita as fases. Sou uma mulher que não seguiu os mesmos caminhos, mas os seus caminhos me moldaram. Sou concha ao invés de pérola. Sou ela ao avesso. E neste, nos realizamos.

Já não conseguiria viver com minha mãe porque já me moldei sozinha. Entretanto, é a certeza desse amor e da sua presença ainda neste mundo que me sustenta tantas vezes. O amor de mãe vem antes da primeira vista. Ama-se o que ainda não conhece. Ama-se aquilo que um dia pode te causar a maior dor. Ama-se o que mais tarde, fatalmente, você vai deixar partir. Ama-se pela simples existência, sem a mínima exigência de troca.

Sou filha, e talvez nunca venha a ser mãe, se esse for o meu destino. Mas do lado de cá, também existe a incondicionalidade. Amo a minha mãe desde que a vi, antes de a conhecer. Amo -a por nunca ter me causado dor. Sei que um dia, mãe, haverá partida, mas te amo simplesmente por existir.



Hoje é o seu dia. Curta muito os 50 anos e que Deus te ilumine sempre, como sempre fez. Linda mulher.

Feliz aniversário, “Joselita”.

Kadydja

Sunday, May 30, 2010

Silêncio

O silêncio também é grito. É a voz da redenção. A cor cinza que torna os olhos opacos, cegos na crença. Silêncio é sintoma do olhar que já não tolera o que está a sua volta. Não é fuga, é uma forma de encarar o tempo sem contestá-lo.

Silêncio é protesto. É a última tentativa de enxergar por fora o que te assombra, inquieta, dói. É contravenção em uma época onde se fala demais. Uma época em que viver a vida do outro dá mais tesão do que viver a sua.

Silêncio é desdém para o alheio e seu poder barato. É sabedoria de impor limites. É uma forma de criar barreiras para a ignorância. É a melodia do perdão para as almas. É caminho para encontrar a si mesmo, e preservar seus valores.

Silêncio é sonho. É a comunicação mais sublime. É a mão abstrata que pede ajuda, mas que ao mesmo tempo barra o que te faz infeliz. É um despertador de problemas. É um mergulho à procura de soluções. É retirada pra trilhar um novo percurso, mais confiante, menos vulnerável.

Silêncio é resposta.

Monday, May 24, 2010

Caminho de volta



O caminho de volta é parte das voltas
que o mundo dá.
O ruído da porta é aconchego da rota
quando se quer chegar.
O instante do encontro é a virada do ponto
quando se precisa seguir.
O timbre da voz é o presente do algoz
quando se limita a ouvir.

Kadydja Albuquerque (25.05.2010)

Sunday, May 9, 2010

A menina e a boneca



A menina tinha uma boneca
e seu nome lhe fazia rir.
A boneca tinha uma menina
e lhe ensinou a fingir.

Fingia colo,
fingia medo.
Fingia amor,
Fingia segredos.

A menina criava mundo
para sua amiga de pano,
que em silêncio profundo,
alimentava o coração humano.

A boneca tinha uma canção,
que a menina lhe escreveu.
Um universo, um refrão,
que um dia pereceu.

Virou moça, virou ano.
A boneca foi pra estante.
Com ela, foram-se os panos
daquele universo infante.

A menina foi pra vida,
que não lhe fazia sorrir.
Criou mundo, e outras canções,
que alguns não souberam ouvir.

Virou mulher, virou ano.
O sonho já não morava ali.
Em seu coração criou pano
e reaprendeu a fingir.

Texto e Foto: Kadydja Albuquerque

Sunday, March 21, 2010

Aos Domingos



Eu nunca consegui ser completamente feliz aos domingos.

Domingo é um dia com cara de ultimato. Em mim, nunca soou como o primeiro dia da semana. Nunca teve aquela sensação de recomeço. Nunca me fez sentir cheiro de flores ou achar que a vida vale a pena. O domingo sempre me acorda, de conchinha, provocando solidão como um namorado que já não se ama.

Domingo é invariavelmente espelho mesmo que eu não saia da minha cama para encarar o banheiro. Domingo nunca é o dia em que eu recebo boas notícias. Você nunca chegará em um domingo carregando flores, chocolates e a tão esperada promessa de dias melhores.

Tenho fobia a noites de domingo. Existe um nome científico para isso? As noites de domingo debocham dos solitários ou daqueles que amam o passado, como eu. Não há misericórdia no pôr-do-sol de um domingo. Não há compaixão dos casais que saem à rua para aproveitar o dia. Não há sol que aqueça o coração ou comédia no cinema que conforte o que insiste em ser triste.

Minhas melhores poesias nasceram aos domingos. Porque nascem do nada ou do tudo que gangrena esse vazio. Não sei de nada, mas sinto tudo. E o confronto desenha palavras. Aos domingos, todas as minhas versões me convidam à reflexão. Sou múltipla e esquizofrênica. Não consigo ser escudo para combater o externo. Nem adiantaria. É o que apodrece silenciosamente aqui dentro que me incomoda.

Aos domingos não me expulso. Aos domingos não sinto saudade. Aos domingos me alimento apenas do que não existiu, e me engasgo com o anúncio da segunda-feira. Aos domingos, os meus gatos, e todos os gatos do mundo, são mais amáveis com seus donos porque podem sentir o peso das horas que se arrastam. Aos domingos, as janelas são templos de oração e espera.

Tudo o que se sente e não se deve sentir pisca em neon aos domingos. O coração cresce desordenadamente como uma metrópole poluída e barulhenta. É inútil ouvir canções em alto volume. Os ouvidos estão voltados para dentro.

Ainda que insuportável, o domingo é necessário. É quando nos deixamos abandonar. A bagunça do quarto e a sujeira da mente são permitidas. Somos mais humanos em dias de hoje. E como tudo na vida, ele sempre se despede, e passa.

Friday, March 19, 2010

Fica Dica: Martha Wainwright



Há uns três anos ganhei de um amigo um DVD com centenas de músicas. Até hoje não ouvi tudo. Sou muito relapsa quando o assunto é ouvir todas as mp3s que eu guardo em meu computador ou no meu HD virtual. Hoje, com o Windows media player no random mode, ouvi uma música que me interessou bastante. Fui checar quem era a cantora: Martha Wainwright. O sobrenome não me soou estranho e, após uma pesquisa, descobri que ela é irmã mais nova do Rufus Wainwright, um cara que gosto bastante apesar de não ter muitas músicas dele.

Segundo a Wikipedia, Martha é uma cantora e compositora canadense-americana de folk rock. Ela é filha do cantor folk americano e ator Loudon Wainwright III e da cantora de folk e compositora canadense Kate McGarrigle. Como Rufus, ela participou da trilha sonora do filme “I am Sam”, toda composta com canções dos Beatles. Martha gravou “We can work it out” com Teddy Thompson.



O álbum dela que eu tenho é o “I Know you’re married but I’ve got feelings too” (2008). Só ouvi uma vez, aliás, estou ouvindo agora, mas já gostei das canções. Atenção especial para “Niger River” e “Love is a Stranger”. Uma mais calma, boa para encerrar a noite sozinha no sofá; outra para os dias onde há fé na vida, uma boa maquiagem e um vestidinho pra levantar sua autoestima. Além deste álbum, Martha gravou mais dois e seis EP's. O primeiro álbum em 2005, homônimo; e o último em 2009 com regravações da mome francesa, Edith Piaf. Este, batalho a horas para baixar. Sorte que hoje é um dos dias em que estou com a dita fé na vida e, portanto, tentarei mais algumas vezes.

O que me prendeu mais a sua música foi a sua voz. Geralmente gosto das vozes das cantoras de folk. Ela tem uma voz quase rouca, rasgada, e para mim, agradável. Escolhi um vídeo dela cantando “Stormy Weather”, que não está em nenhum dos seus álbuns, mas é uma música que adoro e que mostra a bela voz da Martha.

No site dela, nenhum indício de que virá ao Brasil.

Fica aqui a dica e descubram mais para me contar! ;-)

Site oficial: http://www.marthawainwright.com/

Ouça também:

Wednesday, March 17, 2010

The thrill is NOT gone


BB King e sua Lucille: "Eu tento opinar sobre as coisas do mundo, mas Lucille fala por mim".

Bem, eu estava planejando fazer mais uma resenha daquelas que sempre escrevo quando vou a um show bastante esperado e, claro, curtido. Acabei de chegar em minha casa, fiz o checklist dos gatos e das coisas que provavelmente eles destruiriam durante 8 dias de ausência. Está tudo em ordem, menos a minha cabeça para organizar ideias. Mas como ando evitando o “deixar pra depois”, vou tentar escrever alguma coisa sobre o que senti durante o show do BB King ontem (17), no Vivo Rio.

Primeiro, posso soltar um palavrão? Então vai lá: “táquepariu” que noite! Estive em Nova Iorque em agosto do ano passado e durante duas noites fui ao bar do BB King. Óbvio que nem sinal do cara por lá. O ambiente é mais um Hard Rock Café do Blues – uma grife pra você dizer que esteve e comprar imãs de geladeira ou palhetas de guitarra. As mesmas palhetas que ele distribuiu assim que adentrou ao palco.


Ele entra no palco e o público aplaude em pé.

O show começou apenas com a banda (e que banda!), que tocou duas músicas. Em seguida, o anúncio do rei da Guitarra. Ele entrou, lento, distribuindo palhetas e sorrisos para os felizardos das primeiras filas. Sentou, dois integrantes da banda o ajudaram a prender a guitarra ao corpo, e ele começou a conversar com a platéia – coisa que faria mais outras tantas vezes ao longo do show.

A cada solo de guitarra, ou quando ele decidia soltar o vozeirão, dois ou três gritavam “Wow!” e puxavam o coro de aplausos. Pra muita gente, como eu, era difícil acreditar que estávamos diante da lenda viva do Blues. Mais difícil ainda acreditar que ele, aos 84 anos, e muitos deles de incontestável reconhecimento musical, seria um adorável “velhinho”. BB King conversa mais com o seu público que puxadora de trio elétrico. Tudo bem que não estávamos vestindo abadás; as cervejas eram servidas à mesa; e o dono da festa não exibia suas pernas em um vestidinho curto e cheio de lantejolas.


Entre uma música e outra, uma boa prosa.

Mas durante pouco mais de uma hora, a lenda conversou bastante com os reles mortais. Elogiou o povo brasileiro. “Vocês são o povo mais amável que conheço”. Falou sobre o RAP americano e como os cantores do gênero cantam coisas ruins sobre as mulheres. Sim, sobre essas ele rasgou elogios também, e brincou: “eu nunca vi uma mulher feia na minha vida”. Ao notar uma loira que dançava despretensiosamente em sua cadeira, ele soltou: “Moça, tenho 84 anos, mas não estou morto. Vá com calma”. Com o sorriso sempre no rosto, BB King não parecia estar cansado, mas não levantou de sua cadeira real um só momento. Apenas no final, ajudado por um assistente e um músico da banda.


BB King se divertindo com o seu talento.

Lembrei do meu pai durante todo o show, principalmente nas horas de “The thrill is Gone” e “Key to the Highway”. A uma certa altura, ele provocou o público: "o que vocês querem ouvir?". Um fã novinho, que estava atrás da minha mesa embrulhado na bandeira de Minas Gerais, gritou insistentemente: "Guess Who!". E ele atendeu. Será que ele conseguiu dormir ontem? Fiquei ligeiramente preocupada depois que o rapaz agradeceu algumas vezes com “BB King, I Love you!”. Mas nós, meninas, tivemos nosso momento também. “You are my sunshine” foi a canção dedicada às mulheres e todas cantaram junto com ele. Além dessas, outras conhecidas como “Love comes to town” e “I need you so”.


Fim de show e só mais um pouco de atenção para os fãs brasileiros.

Ao final do show, ele vestiu seu casaco e um chapéu de palha, e conversou com alguns fãs. Não deu autógrafos, nem pro fã desesperado que havia levado a sua guitarra com a esperança de que teria qualquer rabisco do rei em seu instrumento. O momento de interação havia cessado. Estava bom demais. Durante todo o show conversamos e pedimos músicas; o ensinamos a contar até quatro em português; e quase transformamos o Vivo Rio em um bar típico de Memphis com seus “wows”, e estalos de dedos, e casais que levantavam da mesa para arriscar uma participação mais eufórica. Fomos amáveis como BB King esperava que fôssemos, e como ele não deixou de ser um minuto.

Dedico esse texto a quatro pessoas importantes para que eu vivesse esse momento: meu pai e minha mãe, Paula Lagrotta e Ronaldo Conde. Cada um com o seu gesto generoso e que eu espero retribuir um dia.

Fotos: Kadydja Albuquerque entre cabeças, garçons e aplausos.

Alguns vídeos:




Key to the Highway


Guess Who e Rock me baby

Monday, March 8, 2010

Às vezes / Começo a conhecer-me. Não existo.

Álvaro de Campos era um dos pseudônimos de Fernando Pessoa. Nunca mais publiquei outras poesias aqui que não fossem minhas. Coloco então logo duas deste grande poeta múltiplo.


Às vezes

Às vezes tenho idéias felizes,
Idéias subitamente felizes, em idéias
E nas palavras em que naturalmente se despegam...

Depois de escrever, leio...
Por que escrevi isto?
Onde fui buscar isto?
De onde me veio isto? Isto é melhor do que eu...
Seremos nós neste mundo apenas canetas com tinta
Com que alguém escreve a valer o que nós aqui traçamos?...


________________________________

Começo a conhecer-me. Não existo.

Começo a conhecer-me. Não existo.
Sou o intervalo entre o que desejo ser e os outros me fizeram,
ou metade desse intervalo, porque também há vida ...
Sou isso, enfim ...
Apague a luz, feche a porta e deixe de ter barulhos de chinelos no corredor.
Fique eu no quarto só com o grande sossego de mim mesmo.
É um universo barato.


Álvaro de Campos

Para ser mulher



Para ser mulher,
precisa muito caminhar.
Precisa entender do amor,
e com ele pactuar.

Para ser mulher,
deve andar pelo tortuoso,
com passos leves e firmes,
e um coração amoroso.

Para ser mulher,
é preciso se contradizer,
sorrir, chorar, cobrar
e deixar o outro ser.

Para ser mulher,
tem que aceitar o desafio
imposto pelo mundo cruel,
como um homem vazio.

Para ser mulher,
deve sempre ter cheiro de rosa,
fitas no cabelo,
sorrisos e covas.

Para ser mulher,
cante uma canção de amor,
acredite e domine o destino
seja pra onde ele for.

Para ser mulher,
basta se conhecer plena,
ser dura e não se entregar
à qualquer coisa pequena.

Para ser mulher,
acolha o mundo em seu ventre.
Não há nesse mundo outro ser
que saiba o que sente.

Mulher,
palavra misteriosa.
Melodia em forma de corpo.
Alma em forma de prosa.

Kadydja Albuquerque (Março / 2010)

Wednesday, March 3, 2010

O dia em que eu assisti ao Coldplay



Meu primeiro contato com o Coldplay foi na época da faculdade enquanto escrevia a minha monografia. Não dei muita importância. Passou essa fase, diploma na gaveta e um Rio de Janeiro inteiro pra conhecer. Quando já morava lá com uma amiga, comecei a freqüentar a casa de outra que era fã da banda. Aí fui de fato apresentada ao Coldplay. Ouvíamos incansavelmente todas as canções do Parachutes. Logo, adotei Shiver como a canção que embalaria minhas ilusões. Isso foi em 2002, acho que no ano em que eles fizeram um show no Rio, mas eu era recém-formada, sem emprego e portanto sem grana, e não acompanhei essa outra amiga fã que, a muito custo, conseguiu entrar de graça no show no ATL Hall. Passou a primeira chance.

Depois, quando já morava em Lisboa, em 2004, eles fizeram duas apresentações na cidade. Já estava empregada, mas a grana era curta e a liberdade também. Meu namorado da época não gostava da banda e todas essas variáveis me fizeram perder mais uma oportunidade. Retornei ao Brasil, retornei a Aracaju e acompanhei os lançamentos como uma fã distante. Eles retornaram ao Brasil em 2007, mas também não pude assistir. Dessa vez acho que nem eu mesma tinha tanta esperança de um dia ir ao show dos caras.
Quando eles anunciaram a apresentação do Viva La Vida Tour na Apoteose, eu me prometi que iria nem que vendesse o meu carro. Comprei o ingresso ainda na venda para clientes do Credicard, em novembro do ano passado; comprei as passagens aéreas, e esperei. Quatro meses passaram mais rápido do que aquelas três horas guardando lugar antes do início do show. Como uma boa fã, eu já sabia o setlist, mas quem lembrava dele na hora?



Antes de começar o show, a Apoteose já lotada, veio a traiçoeira vontade de ir ao banheiro. Paula foi comigo para garantir que eu voltaria. No retorno árduo entre dezenas de “com licença” e “por favor”, a banda entrou no palco. Era 20h27. Fiquei um pouco desesperada porque eu havia guardado um local perto do alambrado que delimitava a área VIP da ralé (eu estava nesta última) e a cada passo que eu dava as pessoas se tornavam mais hostis. Eu argumentava que já estava lá antes e uns davam passagem. Quando não adiantava, eu usava a minha técnica desenvolvida em pipocas de micareta, e passava assim mesmo.

Pronto, cheguei ao local onde estavam os outros amigos e agora era curtir o show. Por curtir, entenda-se gritar, pular, cantar todas as músicas, agradecer a Deus por estar lá, reclamar com o casal da frente que tirava mais fotos deles do que prestava atenção, entre outras coisas. Life in Techicolor, Violet Hill, Clocks, tava amando tudo aquilo, prestando atenção em cada detalhe, mas ainda não havia surtado e tal. Foi quando eles começaram com In my Place e depois emendaram com Yellow. Covardia. A Apoteose inteira pulando e aquelas bolas amarelas gigantes passando de mão em mão. O palco completamente amarelo e a banda lá em cima dando o melhor.



Parênteses: o Coldplay é uma banda polêmica. Não pelo trabalho que fazem, mas pela recepção do seu trabalho pelas pessoas. Muitos amam, muitos odeiam. Respeito quem não gosta e não sou daquelas fãs que tentam catequizar os não-simpatizantes. Eu gosto, as músicas possuem uma relação direta com várias fases da minha vida e isso me basta. Mas mesmo que eu não gostasse, não há como achar que os caras são boçais. A interação deles com o público na Apoteose foi a mais sincera possível. Chris Martin se esforçou para falar português, pedia feedback da multidão e ainda tentava chegar o mais perto do público utilizando todos os espaços do palco.

Voltando... mais outras músicas e veio Fix You, Lost, e em seguida eles fizeram o que eu estava esperando desde que cheguei e vi aquele palco menor no meio da Apoteose. Ninguém acreditava em mim quando eu dizia: eles vão descer e vão tocar aqui, e nessa hora vai ter a chuva de borboletas. As meninas diziam: ah, que nada, você tá maluca que os caras virão aqui?

E eu estava certa, tirando a chuva de borboletas que ficou pra depois. Como acreditava realmente no que eu estava dizendo, me posicionei a 5 metros do palco. Acabou Lost e começou a tocar “Singing in the rain” enquanto eles desciam pelo corredor que dava acesso ao palco menor. Eu acreditava no que eu havia dito, mas não acreditava no que estava vendo. Há umas duas semanas, escrevi para o site oficial do Coldplay perguntando se havia chance deles tocarem Shiver no show do Rio. A resposta veio naquela hora. Chris posicionou o microfone para a direção em que eu estava e falou: Shiver.


Foto: Kaká Barbosa.



OK, ele nunca vai saber da minha existência, mas naquele momento ele estava cantando pra mim e eu não consegui cantar, nem fotografar, nem levantar as mãos pro alto, nem chorar e tampouco aplaudir. Fiquei em silêncio e lembrei de todas as vezes que ouvi aquela canção, e de quantas chorei. Lembrei das tardes de domingo no Rio ouvindo Parachutes, das caminhadas pelas ruas de Lisboa com meu discman, das manhãs no ponto de ônibus em Salvador indo para o trabalho, das noites quando estava recém-chegada em Aracaju e que durante seis meses eu ouvia essa canção antes de dormir tentando trazer de volta o passado. Lembrei do presente e das suas lições. E não chorei, não gritei, não tive pena de mim. A música me conectou a momentos muito fortes e eu percebia que já não havia nada em mim hoje que os quisesse de volta.


Foto: Kaká Barbosa.

Depois o show se tornou o resto do show pra mim. Emocionante, claro. Lovers in Japan e, finalmente, a chuva de borboletas. O bis com The Scientist. A chuva que não cessava. O apagar das luzes do palco e o acender das luzes da Apoteose. A comemoração cúmplice com os amigos. O retorno para casa. Quem é fã de algum artista ou de alguma banda, sabe da emoção desse encontro, ainda que coletivo, com o seu ídolo.


Molhados e Felizes.


Tudo foi perfeito como não poderia ser de outro jeito.

Tuesday, February 23, 2010

A caçula sempre intrometida


Independência é algo que sempre sonhamos em conquistar quando somos adolescentes. Durante muitos anos, quando ainda morava com meus pais e meus irmãos, eu sonhava com o dia que tivesse a minha própria casa, a minha privacidade, meu emprego e minha liberdade de viver a minha bagunça. Esse dia já chegou pra mim e até gosto de viver sozinha, pois já não sei como seria dividir o espaço com outra coisa viva que não tenha quatro patas e mie quando tem fome.

Hoje é aniversário da minha irmã, e em momentos como esse, penso o quão difícil é viver longe da família. É também nessas horas que percebo que já vivo longe há muito tempo, e quantas vezes perdi aniversários, dias das mães, dos pais, feriados, carnavais. Ingrid é minha irmã mais nova e temos uma diferença de 6 anos que, naturalmente, a cada ano se torna menor.

Quando éramos mais novas e dividíamos o mesmo quarto, havia briga, incompatibilidade de idades, de gênios, de formas de viver o espaço que pertencia a nós duas. Eu, adolescente, queria a privacidade para curtir a turbulência de descobertas e questionamentos que eu transferia para meus diários em um ritual que hoje já não existe. Ela, ainda criança, queria viver o lúdico, as brincadeiras de boneca, ou simplesmente me assistir sendo adolescente. Isso irritava, causava desentendimentos e eu desejava ter nascido no lugar do meu irmão – o único homem e com direito a um quarto só pra ele.

Não sei o quanto eu a influenciei ou a influencio. Talvez eu nem seja um bom exemplo de irmã. Distante, ocupada, e sempre leve e engraçada nos encontros porque breves. Também talvez isso nem importe muito. Os caminhos da vida ditam os protocolos que devemos seguir. O que importa na verdade é que tenho a minha família aqui, em algum lugar, sempre potencialmente perto, seja em pensamento, seja nos milhares de e-mails que trocamos sempre que há um assunto comum.

E hoje é o dia da minha irmã, a caçula “sempre intrometida”, como um dia escreveu meu pai em uma das suas poesias. E que ela gostou tanto do eufemismo que resolveu tatuá-lo. É isso, minha querida, seja na pele, na alma ou no sangue, estamos para sempre tatuadas uma na outra. Somos espelhos. Quando olho para você, me vejo muitas vezes como era no passado, mas desejo que o seu futuro seja ainda melhor do que o meu presente. E será.

Daqui, estarei sempre torcendo por você. E te parafraseando: e quem quer saber? ;-)
Parabéns!

Wednesday, February 17, 2010

Carnaval 2010: alegria, alegria é o estado que chamamos Bahia...

Por conta dos shows do Coldplay e do BB King agora em fevereiro e março no Rio, eu havia planejado sacrificar meu carnaval e ficar em Aracaju, curtindo minha casa, meus gatos, meus livros novos e acompanhando a folia alheia pela internet. Mas como a vida é tudo, menos previsível, recebi o convite para ir ao Carnaval de Salvador dois dias antes de começar oficialmente o período momesco. Tudo se encaixava: a vontade de estar com os amigos, a pressão do meu pai em me ver na Bahia, o meu trânsito astral e a possibilidade de retornar ao carnaval soteropolitano com custo quase zero. Como eu não sou de dizer não ao destino, embarquei sem preconceitos e com a alma aberta.

O último carnaval em Salvador foi em 2005, e até então tinha sido, no quesito “Fechação em grupo”, a melhor viagem da minha vida. Mas eu ainda estava traumatizada com os carroceiros, os chutes na canela, e o carinho intenso da pipoca. Tá, como dessa vez o esquema seria All Inclusive e a pipoca era algo que encararia só de passagem, relaxei. No sábado, já comecei com o pé direito no Camarote do Nana. E eu que achava que freqüentava camarotes. Nunca vi uma estrutura tão profissional, e o mais perto que cheguei do carnaval da Bahia foi ver Bel entrando com Gilberto Gil pra fazer um show na passarela. Um momento lindo, seja porque eu já estava totalmente rendida ao meu ofício de chicleteira, ou seja porque eles chegaram “chegando” ao som de Andar com fé.

Sou fã de Gil, e se tivesse uma carteirinha de Gilberteira, eu com certeza exibiria uma na minha bolsa. Então, tirem daí a emoção que eu senti. Depois disso, adeus trios, avenida e abadás... eu já estava em outros ambientes do camarote, e pouco importava se a festa era em fevereiro ou em novembro. Comida à vontade e garçons, como diria meu amigo Rod Rocha, com raiva da bebida. É como soltar uma criança numa piscina de bolinha. A noite acabou mais do que bem, e acho que é por isso que as outras, mesmo divertidas, não bateram o meu retorno à folia baiana.

No domingo, em vez de chicleteira, virei andarilha encantada e admiradora de celebridades no Camarote da Contigo / Daniela Mercury. Também muita comida, mas dessa vez garçons menos raivosos. (Lícia Fábio, uma dica: Fresh não é modalidade de cerveja! Antes servir Skol com gelo). Também o clima era viáipi demais. Não consegui me soltar tanto, só na hora que o sambão começou e eu encontrei um grupo de subcelebridades que me acolheu durante 3 músicas porque meu primo já estava em outro mundo, e eu precisa socializar pra não me sentir sozinha. Vi muitos globais e só conseguia pensar em uma coisa: como eles são menores do que na TV. Ok, não ganhei meu dia por causa desses encontros, e o melhor momento na verdade foi quando Daniela passou pelo camarote e eu desci pra pipoca (sim, eu não fiquei lá logo na hora em que a dona chegou) para encontrar Rod e Oc. Entrei no bloco, fui expulsa, mas foi legal. Depois retornei pra lá e continuei me sentindo deslocada.

Segunda. Acordei indecisa. Pra onde vou? Podia ter escolhido mais um camarote, mas resolvi que precisava viver a experiência de sair em um bloco no Carnaval de Salvador antes de completar 30 anos, casar, ter filhos, virar Hare Krishna, morar na Europa, ou simplesmente morrer, como acontece com todo mundo. Seria muito arriscado deixar pro ano que vem, já que estou programando meu carnaval em outra cidade. Então, acionei os micareteiros Rod e Oc, peguei meu abadá do Papa, e fui relembrar os tempos de Com Amor e Bora Bora ao som de Claudia Leitte. Fiquei orgulhosa de mim porque eu ainda tenho pique pra encarar a avenida, embora eu pudesse ser facilmente a tia do bloco. Não vou comentar o que aconteceu nesta noite porque quero que vocês exercitem a imaginação. Hahahahaha... mas foi ótimo, tirando o prejuízo de 150 reais, que eu deixei em algum banheiro químico da Ondina.

Como eu não agüentaria duas noites no esquema bloco-pipoca-sanduiche em barraca suspeita-prejuízos em banheiros químicos, finalizei o carnaval no Camarote Ondina com minha irmã e o namorado. Ambiente que eu já havia me acostumado: comida à vontade, garçons raivosos e gente bonita. Nunca comi tantos churros na minha vida. Ganhei duas garrafinhas de Sagatiba por mérito e, depois de dois anos, comi acarajé novamente. Quanta superação nesse carnaval.

Agora retornando para casa, depois que eu já matei as saudades dos meus filhotes, penso que a minha decisão de curtir o carnaval na Bahia foi acertada. Foram quatro dias ao lado de pessoas muito queridas, conhecendo a folia sob uma outra perspectiva, aprendendo a dançar o rebolation e celebrando a vida sem medo de acordar cantarolando “Vale Night”. Sempre acho que devemos viver o que nos é colocado no caminho. E como uma boa brasileira, só posso gostar de estar no carnaval, porque o sentimento coletivo é de alegria e celebração. Seria bom que o resto do ano fosse assim. Ou talvez não, né, porque do jeito que eu sou intensa, reduziria minha expectativa de vida em muito.

É isso, gente. Muito tempo sem postar no blog. Continuo escrevendo minhas poesias, meus contos, meus devaneios latentes nesta cabecinha a mil. Mas são tão meus que o sentimento de posse não me deixa dividir. Então resolvi contar um pouco do meu carnaval. Agora é preparação para o momento mais esperado em 2010: o show do Cold no Rio daqui a 10 dias!! Já comecei a sonhar com o Chris, hoje já acordei ouvindo os caras, e com certeza depois contarei aqui esse momento se eu não tiver desmaiado na segunda música.

Agora vamos nessa que o ano começa...

Wednesday, January 20, 2010

Diálogo entre o coração e o mundo


A Zygmunt Bauman, o pai dos sentimentos líquido
s.


- Aqui fora faz calor.

- Aqui dentro também.

- Mas o calor que aqui fora faz, é o sol quem traz.

- E aqui dentro é por querer tanto bem.

- Se bem tanto quer, por que o calor atormenta? Deveria ser um bom conforto pra você que está quase morto.

- Seria se acolchoado por tantas palavras fosse esse coração. Ou ainda embalado pelos gestos que enxotassem a solidão.

- Então o calor é apenas de esperança?

- Há, meu amigo, em todo peito uma criança. Olhos que pulsam assustados com o futuro. Na maneira como eu vivo, não há nada seguro.

- Sei muito sobre o que você discorre triste. Eu sou o mundo e carrego todos os pesos. Segurança em mim não existe. Sou palco dos humanos e seus erros. O futuro não posso controlar. Mas você, bem guardado em sua casa, é palco de um só ofício: amar.

- Não esqueça, mundo, que vivo em uma casa onde a residência é o seu palco. Sou vítima dos pesos, dos erros, do asfalto. Sou um soterrado pelos terremotos da mente. Como posso amar quase morto, dormente?

- Mas querer tanto bem é um passo para amar.

- Seria se você fosse outro, mundo. Seria se a minha casa fosse um lar.

Kadydja Albuquerque > 20.08.2009